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Medo e incerteza marcam remoção de famílias em área de barragem em Brumadinho

  • Foto do escritor: Moisés Oliveira
    Moisés Oliveira
  • 30 de jul.
  • 3 min de leitura
Foto: Alex de Jesus / O TEMPO
Foto: Alex de Jesus / O TEMPO

Duas famílias da comunidade Quéias, em Brumadinho, foram removidas de forma emergencial nesta terça-feira (29) após a elevação para o nível 2 de emergência da barragem B1-A, da empresa Emicon Mineração e Terraplanagem. O alerta foi emitido pela Agência Nacional de Mineração (ANM) no último dia 23 e, embora não signifique risco iminente de rompimento, exige a evacuação imediata da área considerada de alto risco. Outras cinco famílias devem deixar suas casas nos próximos dias. A situação gerou comoção e revolta entre os moradores, que relatam abandono, medo e a sensação de estarem revivendo a tragédia de 2019, quando o rompimento da barragem da Vale ceifou 272 vidas em Brumadinho.

Roberto Hastenreiter, de 74 anos, aposentado, foi um dos primeiros a ser retirado. Ele trocou Belo Horizonte pela tranquilidade do campo há sete anos, mas agora vive sob tensão. Na tarde de terça, se despediu do seu quintal como quem deixava para trás um pedaço da própria história: árvores frutíferas, o cachorro, o silêncio da mata. “Aqui eu tinha tudo, e vai ficar abandonado”, lamentou. Ao lado da esposa, filha e animais de estimação, foi levado para um sítio alugado pela prefeitura, em outra região do município. A mudança, inicialmente temporária, não tem previsão de fim.

A Prefeitura de Brumadinho assumiu a frente do reassentamento das famílias após a ausência de medidas efetivas por parte da mineradora. O Executivo organizou moradias alugadas e próximas à zona rural para preservar o modo de vida das famílias e manter os vínculos com escolas e trabalhos. Caminhões da Defesa Civil estão encarregados de transportar pertences, animais domésticos e até o gado das propriedades afetadas. A advogada Deborah Jacques, que representa os moradores, questiona a omissão da empresa e afirma que as estruturas da mina estão sem manutenção desde 2014. “Não temos sequer certeza se a barragem está realmente no nível 2 ou se já evoluiu para o nível 3”, afirmou.

A situação é ainda mais angustiante para Dayane Gonçalves, de 33 anos, grávida de cinco meses. A moradora será retirada nesta quarta-feira (30) com o marido, o filho de 7 anos, o cachorro e as galinhas. Ao saber que teria de deixar sua casa, Dayane passou mal e precisou de atendimento médico. “Essa mudança tira a paz da gente. Não dormi de noite”, contou. Há dois anos, placas de “área de risco” foram fincadas em volta do terreno, mas segundo ela, nunca houve explicação clara sobre o perigo.

Outra vítima do deslocamento forçado é o pedreiro Antônio Souza de Oliveira, que morava provisoriamente numa casa ainda em construção. A obra, avaliada em R$ 120 mil, estava prestes a ser concluída. “Agora que ia terminá-la, tenho que sair do nada?”, questionou o proprietário, Odilon Souza. Ambos assistiram à remoção de Roberto em silêncio, compartilhando a incerteza sobre o futuro.

A barragem B1-A tem 37 metros de altura, 273 metros de crista e capacidade para armazenar 914 mil metros cúbicos de rejeitos. Embora seja muito menor que a estrutura da Vale que colapsou em 2019, sua localização e estado de abandono preocupam. A elevação do nível de emergência foi motivada pela ausência de documentos técnicos obrigatórios, como o plano de emergência atualizado e sistemas de alerta automatizados. O Ministério Público aplicou multas diárias à empresa e pediu a apreensão dos passaportes dos sócios da Emicon.

A comunidade pede agora que as casas desocupadas recebam sistema de vigilância por câmeras para evitar invasões e furtos. Segundo os moradores, a prefeitura se comprometeu a contratar o serviço de monitoramento, mas ainda não confirmou oficialmente. Também foi prometido apoio psicossocial e inclusão em programas assistenciais por meio do CRASEC, além de intermediação de emprego via SINE.

Para os moradores de Quéias, o sentimento é de frustração e abandono. A lembrança da tragédia de cinco anos atrás está viva, e a falta de respostas reforça o temor de que a história possa se repetir. “Me deram um rádio sem pilha que nunca tocou. Só colocaram as placas e sumiram. A gente vive no escuro, sem saber o que vai acontecer”, desabafou Roberto, que agora tenta encontrar paz longe do lugar que escolheu para envelhecer com dignidade.




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