
Seis anos após o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, Minas Gerais, um estudo conduzido pela Fiocruz Minas e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) revela que a exposição a metais pesados continua alarmante. Crianças de até seis anos tiveram aumento significativo na detecção de metais na urina, com destaque para o arsênio, que teve crescimento de 42% para 57% entre 2021 e 2023. A presença de cádmio, mercúrio, chumbo e manganês também foi detectada em todas as amostras analisadas. O estudo acompanha a população desde 2021, evidenciando impactos persistentes do desastre na saúde dos moradores.
A pesquisa abrange todas as regiões do município, segmentando a população entre áreas diretamente afetadas pela lama, regiões de mineração ativa e locais sem exposição direta. Entre os adultos, cerca de 20% das amostras indicaram níveis elevados de arsênio, enquanto entre os adolescentes o percentual chegou a 9%. Entretanto, dependendo da localização, esse índice atingiu 20,4%, reforçando a preocupação com a contaminação ambiental. Mesmo com leve redução de alguns metais entre 2021 e 2023, os resultados sugerem a manutenção da exposição da população a essas substâncias tóxicas.
Flávia Campos, fisioterapeuta e moradora de Brumadinho, tem papel fundamental na intermediação entre as instituições de pesquisa e a comunidade. Atuando diretamente no Projeto Saúde Brumadinho, ela auxilia na comunicação com gestores municipais e serviços de saúde, buscando garantir que os moradores tenham acesso a informações e acompanhamento adequado. Para ela, o levantamento é essencial para documentar cientificamente os impactos do rompimento da barragem, mas também traz desafios psicológicos aos afetados. "Saber que se tem um nível alto de metal pesado no organismo pode ser angustiante, pois gera incerteza sobre os impactos futuros na saúde", avalia. Flávia destaca que a exposição a metais não significa intoxicação e que os resultados devem ser analisados no contexto de sintomas e histórico clínico.

A pesquisa também apontou que os casos de doenças crônicas têm aumentado entre os moradores. Entre os adolescentes, o percentual de diagnósticos de asma ou bronquite subiu de 12,7% para 14% entre 2021 e 2023. Em adultos, houve crescimento expressivo nos casos de colesterol alto (de 20,9% para 28,5%), hipertensão (de 27,9% para 30%) e problemas crônicos de coluna (de 19,7% para 22,8%). O diabetes também apresentou elevação, de 8,7% para 10,7% no mesmo período. Além disso, sintomas como irritação nasal e câimbras tornaram-se mais frequentes, aumentando de 31,8% para 40,3% e de 25,2% para 34,4%, respectivamente.
A saúde mental também tem sido um ponto de preocupação para os pesquisadores. Entre adultos, a taxa de diagnóstico de depressão passou de 21,3% para 22,3% entre 2021 e 2023, quase o dobro da média nacional de 10,2% registrada pelo IBGE. A ansiedade ou problemas do sono foram relatados por aproximadamente 32,7% da população, sem grandes variações ao longo dos anos. O número de adultos que relataram dificuldade para dormir em três ou mais noites por semana aumentou de 26,7% para 35,1%, evidenciando um impacto significativo na qualidade de vida.
A procura por serviços de saúde também cresceu no município, especialmente no Sistema Único de Saúde (SUS). Entre os adolescentes, o percentual de quem realizou três ou mais consultas médicas subiu de 21,7% para 44,1% entre 2021 e 2023. Entre os adultos, a busca por atendimento aumentou de 38,6% para 53,7% no mesmo período. O SUS continua sendo a principal referência para a maioria dos entrevistados, com crescimento na procura pela Atenção Primária à Saúde, que passou de 56,8% para 64% entre os adultos.
Na população infantil, além da exposição a metais, o estudo analisou o desenvolvimento neuromotor e cognitivo das crianças através do Teste de Denver II. Os resultados indicam que o percentual de crianças com risco de atraso no desenvolvimento caiu de 42,5% para 28,3% entre 2021 e 2023. Houve ainda melhora nos índices de obesidade e sobrepeso, com redução de 11% para 4,6% e de 12,5% para 4,6%, respectivamente. Para os pesquisadores, esse avanço pode estar relacionado à retomada das atividades escolares e da interação social após a pandemia de covid-19.
O estudo é parte do Programa de Ações Integradas em Saúde de Brumadinho, que inclui o Projeto Saúde Brumadinho e o Projeto Bruminha. Em 2023, a pesquisa envolveu 2.825 participantes. Os pesquisadores reforçam a importância da continuidade do acompanhamento para entender os impactos a longo prazo.
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