top of page

Estudo aponta que recuperação total do rio Paraopeba pode levar até 741 anos

Foto do escritor: Talles CostaTalles Costa
Foto - Michelle Parron/Divulgação
Foto - Michelle Parron/Divulgação

Seis anos após o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, os impactos da tragédia ainda afetam diretamente a vida dos atingidos, especialmente daqueles que dependiam do rio Paraopeba. O desastre ambiental, ocorrido em 25 de janeiro de 2019, matou 272 pessoas e contaminou gravemente o rio, que segue impróprio para uso. Apesar de um acordo firmado em 2021 determinar que a mineradora deve arcar com a recuperação total da bacia, estudos apontam que a retirada dos rejeitos pode levar séculos, tornando incerta a possibilidade de revitalização completa do manancial.

Hélia Baeça, 59 anos, moradora da comunidade de Vista Alegre, em Esmeraldas, está entre os muitos que sentiram a perda de forma irreversível. O rio Paraopeba, que antes fazia parte de sua rotina e garantia sustento e lazer, hoje representa uma lembrança do que foi tirado. "É como se tivessem arrancado um pedaço da nossa vida. Perdemos não só o acesso à água, mas a nossa liberdade de viver", lamenta. O caso de Hélia reflete a realidade de centenas de famílias que dependiam do rio para a pesca, agricultura e abastecimento doméstico.

O Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab) realizou um estudo para calcular o tempo necessário para que os rejeitos sejam totalmente removidos. O cenário mais otimista prevê 44 anos de dragagem, enquanto a estimativa mais pessimista indica que o processo pode se estender por impressionantes 741 anos. Essa variação ocorre devido a incertezas sobre o volume de rejeitos despejados no Paraopeba. Enquanto a Vale estima que 1,59 milhão de metros cúbicos de rejeitos atingiram o rio, estudos publicados no International Journal of Sediment Research indicam que esse número pode chegar a 2,8 milhões de metros cúbicos.

Outro fator que influencia o tempo necessário para a limpeza é a capacidade das dragas de remover os sedimentos contaminados. Inicialmente, a proporção de rejeito era de 90% para cada metro cúbico retirado. No entanto, com o passar dos anos, esse percentual caiu drasticamente, tornando o processo cada vez mais ineficaz. Hugo Salis, engenheiro florestal e coautor do estudo, destaca que nos primeiros anos após o desastre, mais de 2.000 metros cúbicos eram removidos diariamente. Atualmente, esse volume caiu para apenas 30 a 100 metros cúbicos por dia, dificultando ainda mais a remoção completa dos rejeitos.

As informações sobre a remoção dos rejeitos podem ser acessadas em um painel no site da Vale. De acordo com o último dado disponível, de 20 de janeiro, foram retirados 195 mil metros cúbicos de rejeitos. No entanto, especialistas apontam que essa remoção está longe de ser suficiente para garantir a recuperação total do rio. Ramon Rodrigues, especialista socioambiental e um dos responsáveis pelo levantamento, ressalta que a inviabilidade da retirada total dos rejeitos já era prevista no acordo firmado entre a mineradora, o governo de Minas Gerais e as instituições de Justiça. O documento prevê que, caso a limpeza completa não seja possível, a Vale deverá indenizar os atingidos financeiramente. "Mas quanto vale um rio?", questiona Rodrigues, destacando a dificuldade de mensurar os danos causados.

A mineradora afirmou que continua realizando ações para a remoção dos rejeitos e que as atividades são acompanhadas por consultorias independentes. Em nota, a empresa ressaltou que em alguns pontos do rio o rejeito se misturou aos sedimentos naturais, tornando a remoção mais complexa. Por isso, segundo a companhia, as soluções técnicas para a recuperação do Paraopeba são avaliadas em conjunto com os órgãos competentes.

Fernando Pacheco, professor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, em Portugal, destaca que, além da dragagem, a recuperação do Paraopeba também depende de um processo natural de depuração ao longo dos anos. Segundo ele, como o rompimento aconteceu no primeiro terço da bacia, os rejeitos que avançaram acabam se misturando com sedimentos de outros rios, o que auxilia na diluição da contaminação. Entretanto, o professor adverte que esse processo é gradual e que a contaminação ainda persiste em vários trechos.

Pacheco participou, entre 2021 e 2023, de um estudo que analisou o possível retorno do Sistema Paraopeba, responsável por 30% do abastecimento de água da região metropolitana de Belo Horizonte. O levantamento concluiu que, em condições favoráveis de vazão extrema, o abastecimento poderia ser retomado entre seis e oito anos após o rompimento da barragem. No entanto, o professor ressalta que a recuperação plena deve ocorrer em todas as épocas do ano para que a captação de água volte a ser viável.

A decisão sobre quando o rio Paraopeba poderá voltar a ser utilizado para abastecimento cabe ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), que avalia parâmetros como turbidez e presença de metais pesados como ferro, manganês, chumbo e mercúrio. Enquanto a incerteza persiste, moradores como Hélia continuam sem resposta sobre quando poderão retomar suas vidas, enquanto a sombra da tragédia de Brumadinho ainda paira sobre os atingidos. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.

Comments


Anuncie Apoio_edited.jpg
parceria REGIONAL + INDEPENDENTE.png
Logo Isabelly.png
Anúncio quadrado - Independente.png
bottom of page